O Grêmio que eu gostaria de ver
- Alexandre Patz Hein
- 16 de abr. de 2021
- 6 min de leitura
Atualizado: 16 de abr. de 2021
Por Alexandre Hein*
Tiago Nunes é o (meu) nome da vez. Mas por quê?
Desde que assumiu a gestão do Grêmio, em janeiro de 2015, Romildo Bolzan vem demonstrando um projeto muito claro para o clube: modernização dos processos internos e ajustes financeiros, montagem de elencos competitivos e a utilização das categorias de base na equipe principal. Ao renovar o contrato do técnico Renato Gaúcho, em março deste ano, o mandatário tricolor reforçou, com certa veemência, dois, destes três pilares da sua gestão: a forte utilização da base e que o Grêmio iria ser competitivo em todas as frentes que disputaria na temporada de 2021.
Passados 45 dias, a derrota na final da Copa do Brasil para o Palmeiras, somada da queda na Pré-Libertadores para o Independiente Del Valle, levaram a mudança no comando técnico tricolor. Sai o maior ídolo da história do clube – com todos os méritos – e se encerra um trabalho de 5 anos. Um trabalho marcado pelo fim da “seca” de títulos, duras derrotas, atletas revelados e superávits muito comemorados pela gestão gremista. Mas e agora? O ano já começou, quatro competições para disputar título, quem deve assumir o lugar de Renato? Ao meu ver, o nome da vez é Tiago Nunes.
Por que acredito que o técnico de 41 anos, gaúcho de Santa Maria, é o nome certo para o Grêmio? Primeiro: o discurso do presidente Bolzan antes da final da Copa do Brasil e do início da temporada de 2021. Ele afirmou que o clube precisava voltar a utilizar fortemente as categorias de base. Este discurso, foi reforçado pelo atual CEO e também gerente de futebol, Carlos Amodeo, em entrevista para a TV Bandeirantes nesta sexta-feira (16). Tiago Nunes trabalhou nas categorias de base do Grêmio, promoveu “meninos” no Athletico e sempre buscou uma integração do profissional com as categorias menores nos dois clubes que passou recentemente. Segundo e talvez o mais importante para o momento atual: o Grêmio precisa evoluir nos seus conceitos de jogo. Para isso, acredito que quem melhor “casa” as suas ideias de jogo como treinador com a filosofia de futebol (contexto + elenco) dos últimos anos do Grêmio, é o ex-treinador de Corinthians (de trabalho medíocre) e Athletico (trabalho irretocável).
A análise a seguir foi feita da seguinte forma: como Tiago Nunes jogava no Athletico e onde o elenco do tricolor porto-alegrense se encaixaria. Obviamente esta é uma análise teórica e “imaginativa” do autor que vos escreve. Para mim, o Athletico era uma equipe que tinha conceitos claros e bem executados em todas as fases do jogo, como também, respondia muito bem as ideias e situações que os adversários propunham dentro dos jogos, algo que o Grêmio não vinha conseguindo.
Sistemas Base
Em resumo, parte do 4-2-3-1 em fase ofensiva (com variações) e opta pelo 4-4-2 (duas linhas + 2 a frente) na fase defensiva. A segunda, muito bem consolidada e sem tantas variações de sistema. O posicionamento inicial que Tiago Nunes gosta de utilizar não difere tanto do utilizado pelo Grêmio nos últimos anos. Ponto positivo para uma adaptação rápida e introdução dos demais conceitos. Desta maneira, vejo o Grêmio partindo assim:

Fase Ofensiva
Apesar de muitas pessoas acreditarem que o Athletico de Tiago Nunes se caracterizava por ser uma equipe apenas de forte contra-ataque, o time apresentava uma fase ofensiva bem estabelecida, com ideias/conceitos claros e variações de posicionamento conforme a situação que encontrava nas partidas.

Na primeira fase de construção, contra equipes que defendem em linha média / meia pressão, os zagueiros tem papel inicial na armação. Laterais buscam a amplitude em altura diferente dos zagueiros e volantes constroem por dentro e tem liberdade de movimentação. Os laterais buscam estar “alinhados” com a primeira linha adversária, possibilitando que, com um passe qualificado e domínio correto, já possam vencer estes primeiros adversários. Condições totais para executar com o elenco atual do Grêmio.

Ainda na fase ofensiva, as equipes de Tiago Nunes apresentam uma variação cada vez mais estabelecida no futebol atual: construir com 3 (imagem anterior). Quem tem este papel é um dos volantes (Matheus Henrique, Thiago Santos ou Lucas Silva). Porém, o mais importante não é isto, mas sim, os outros conceitos nesta fase de jogo. Entre eles, destaco a ocupação de diferentes faixas do campo, tanto em amplitude como em profundidade/altura. Podemos observar os laterais “altos” ocupando as beiradas, volante central no auxílio à linha de 3, meia e pontas centralizados buscando os espaços por dentro e o atacante “fixando” os zagueiros para abrir espaço aos jogadores do centro. Estes conceitos são vistos tanto na “armação de 3” como também quando a equipe posiciona apenas os 2 zagueiros na base da jogada. Cabe destacar, que o elenco do Grêmio possibilita variar as funções dentro de campo e diferentes atletas podem ocupar os diferentes setores e posições, como por exemplo, utilizar os “pontas” Ferreira ou Leo Chú jogando na amplitude e Rafinha armando por dentro na linha de 3 ou até mesmo avançado por dentro.
Na parte final do campo de ataque, na criação, a liberdade de troca de posições e funções, a ocupação de espaços pré-estabelecidos e também de espaços criados a partir da criatividade e imaginação dos atletas, onde estes tem autonomia para decidir seguir um caminho prévio (treinado) ou não, é o que torna o futebol bonito e imprevisível. O elenco gremista é recheado de atletas que oferecem essas ferramentas ao treinador. Jogo de 1x1 e velocidade para agredir espaços (Ferreira, Azevedo, Chu, Léo Pereira, Alisson, Luiz Fernando), e a criatividade para combinações por dentro e por fora através do passe, do movimento, da condução ou do pivô (Jean Pyerre, Matheus Henrique, Darlan, Rafinha, Cortez, Guedes, Pedrinho, Pinares, Fernando Henrique, Ricardinho e Diego Souza), são algumas características a serem exploradas.

Na imagem anterior, vemos um ataque a uma defesa em linhas mais baixas, onde triângulos ofensivos são formados. Seguimos enxergando as ideias bem definidas: ocupação de diferentes espaços e alturas na amplitude e na profundidade; jogo entrelinhas através de apoios frontais; ataque ao espaço no lado contrário a bola; equilíbrio defensivo, entre outros. Volto a reiterar ao torcedor gremista: por vezes, o posicionamento dos atletas em campo na fase ofensiva do jogo é parecido, principalmente contra equipes que marcam em linhas baixas, porém, os conceitos são diferentes. O Grêmio, nos anos recentes, se caracterizou por depender apenas das soluções dos atletas.
Ok. Tudo isto é muito bonito no papel. Mas e se o adversário não permitir este jogo construído pelo chão? Qual o contraveneno de Tiago Nunes? Aqui, uma ideia bem estabelecida pelo treinador no Athletico: a utilização da bola longa para o atacante, se a leitura do momento for esta. O Grêmio também se utiliza desta forma de jogar quando é acossado pelo adversário e tem uma forte arma a seu favor: Diego Souza. Ao analisar a imagem abaixo e relacioná-la ao que o Grêmio pratica, temos similaridades. Mas, as ideias no Athletico, ao meu ver, eram mais claras e estabelecidas. A defesa do Athletico, após atrair a marcação do adversário, identifica que está em igualdade numérica (5x5), logo, no campo ofensivo, o ataque está em superioridade (6x5) ou ao menos em igualdade (6x6) se considerarmos o guarda-metas contrário. O goleiro Santos (de muita qualidade na bola longa) busca o pivô, na época o atacante Pablo, nas costas da segunda linha, e, os pontas, o meia atacante, um volante e um lateral, já se projetam para jogar em vantagem a partir da escora do pivô.

Considerando a transição ofensiva / contra ataque, como uma parte da fase ofensiva, seguimos na análise. Este momento do jogo, foi o mais valorizado pela imprensa esportiva nacional ao avaliar o trabalho de Tiago Nunes. E neste quesito eu concordo com os analistas. A fase melhor elaborada e executada que eu vi no Athletico de 2018 e 2019. Os conceitos deste momento, em teoria são simples, pois o adversário está desarrumado, há espaços e não se tem uma defesa fechada para vencer. São eles: mudança rápida de comportamento defensivo para ofensivo de todos os atletas; condução da bola, de preferência pelo centro; jogador que tem a bola, fixa defensores; ataque ao espaço pelos atletas sem bola. Tudo isso parecia automático para os jogadores athleticanos executarem. O mais difícil são os jogadores que não roubaram a bola ou não estão perto da bola mudarem a sua postura e terem o “tino” de tirar proveito desse momento projetando-se ao ataque em velocidade. Tem tudo para dar certo na equipe do Grêmio.

Fase Defensiva
O posicionamento “base” dos jogadores na fase defensiva (imagem abaixo) é muito parecido (4-4-2), porém, os conceitos são completamente diferentes. A principal referência adotada pelo técnico Tiago Nunes é a posição da bola (marcação zona), e não, o adversário (marcação individual), como gosta Renato Gaúcho. Alguns pontos demandam tempo para serem desenvolvidos: as “alturas” das linhas de marcação e o porquê de cada “altura”; as referências adotadas e como se comportar dentro de cada linha (e isto muda a cada “altura” e de acordo com o posicionamento da bola e dos adversários); “gatilhos” de subida para a pressão. São inúmeras ideias a serem introduzidas e o mais difícil, automatizar coletivamente todos os conceitos, ou seja, que todos remem para o mesmo lado.

Por fim, caso a chegada de Tiago Nunes seja concretizada, creio que estas sejam algumas das ideias que veremos nos próximos meses. Acredito que o Grêmio tem um grande elenco, jovens potenciais a serem explorados (Pedrinho, Léo Chu, Guedes, Fernando Henrique, Ruan, Breno, etc) e jogadores que devem ser melhor aproveitados, como Ferreira, e, principalmente Jean Pyerre (gostaria de vê-lo atuando como “8”), talvez o maior talento brasileiro construindo o jogo “de frente”. Espero que tenham gostado da análise.
Forte abraço! Tchau, tchau!
*Alexandre Hein é bacharel em Educação Física, mestre em Ciências do Movimento Humano pela UFRGS, e comentarista da Rádio Repórter de Ijuí.
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